quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Beja, Parque da Cidade (Dezembro 2008).

Che bella cosa na jurnata 'e sole,
n'aria serena doppo na tempesta!
Pe' ll'aria fresca pare gia' na festa
Che bella cosa na jurnata 'e sole.

Ma n'atu sole
cchiu' bello, oi ne'.
'O sole mio
sta 'nfronte a te!
'O sole, 'o sole mio
sta 'nfronte a te,
sta 'nfronte a te!

"O Sole Mio"- canção folclórica italiana



quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Um passo de cada vez...

Beja, Parque da Cidade (Novembro 2008)

Há tempos li uma entrevista sobre um homem com o nome de Dean Karnazes. Este homem é conhecido por ousar desafiar os limites do corpo humano, já tendo conseguido proezas como correr mais de 500 km sem parar, durante mais de 80 horas ou ter feito 200 km em menos de 24 horas sob temperaturas superiores a 50 graus. Começou a correr aos trinta anos, precisamente na noite do seu 30º aniversário, quando ao sair de um bar decidiu mudar de vida e fazer algo louco. Nessa noite correu 48 km.

Questionado sobre qual a técnica mental que utiliza para atingir os seus objectivos ele responde assim: “Eu uso a técnica à qual chamo de baby steps. Em vez de pensar na distância que ainda falta percorrer, que pode ser difícil e exaustiva, quase arrebatadora, focalizo-me apenas num passo de cada vez. Mesmo que ainda tenha centenas de km à minha frente para percorrer, não penso nisso. Focalizo-me no momento e dou um passo de cada vez. Há duas hipóteses: ou continuamos em frente ou desistimos. De qualquer forma é sempre uma aventura!”.

Penso que esta é uma técnica válida não só para a corrida mas para a própria vida. Muitas vezes estamos tão obcecados em atingir determinadas metas que nos esquecemos de abrandar o passo e olhar em volta, ver o sol que se está a pôr, sentir o vento na nossa cara ou falar com quem nos acompanha nessa corrida. Quando apenas nos preocupamos em chegar à meta final a corrida parece não ter fim, apenas queremos saber se estamos quase a chegar parecendo crianças num banco de trás do automóvel que perguntam de quinze em quinze minutos se já chegaram ao destino. Por outro lado, quando nos abstraímos do principal objectivo e, embora continuando a caminhar, apreciamos aquilo que vai surgindo pelo caminho a corrida torna-se mais agradável e quando damos por nós estamos a cortar a meta ao som de uma banda filarmónica.



sábado, 4 de outubro de 2008

Hora de dormir ....

"Esta noite, vou mostrar como se preparam os sonhos. As pessoas julgam que é um processo muito simples e fácil mas é bastante complicado. Como podem ver a chave é uma delicada combinação de ingredientes complexos. Primeiro colocamos alguns pensamentos aleatórios. Depois juntamos algumas reminiscências do dia, misturados com memórias do passado, amor, amizade, relações e todas essas coisas, juntamente com canções que ouvimos durante o dia, coisas que vimos e… Acho que vem aí um … Aí está…"
Stéphane Miroux (Gael García Bernal) enquanto prepara um sonho dentro de uma panela no filme, A Ciência dos Sonhos , realizado por Michel Gondry em 2006
Bons sonhos!!!

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Charlotte (Scarlett Johansson) - Lost in Translation— O Amor É Um Lugar Estranho, realizado por Sofia Coppola em 2003

Después de un tiempo,
uno aprende la sutil diferencia
entre sostener una mano
y encadenar un alma,
y uno aprende
que el amor no significa acostarse
y una compañía no significa seguridad
y uno empieza a aprender…
Que los besos no son contratos
y los regalos no son promesas
y uno empieza a aceptar sus derrotas
con la cabeza alta y los ojos abiertos
y uno aprende a construir
todos sus caminos en el hoy,
porque el terreno del mañana
es demasiado inseguro para planes…
y los futuros tienen una forma de caerse
en la mitad.
Y después de un tiempo
uno aprende que si es demasiado,
hasta el calorcito del sol quema.
Así que uno planta su propio jardín
y decora su propia alma,
en lugar de esperar a que alguien le traiga flores.
Y uno aprende que realmente puede aguantar,
que uno realmente es fuerte,
que uno realmente vale,
y uno aprende y aprende…
y con cada día uno aprende.

Y Uno Aprende - Jorge Luis Borges( 1899 -1986)

sábado, 26 de julho de 2008

Eles não sabem que o sonho
é uma constante da vida
tão concreta e definida
como outra coisa qualquer,
como esta pedra cinzenta
em que me sento e descanso,
como este ribeiro manso
em serenos sobressaltos,
como estes pinheiros altos
que em verde e oiro se agitam,
como estas aves que gritam
em bebedeiras de azul.

Eles não sabem que o sonho
é vinho, é espuma, é fermento,
bichinho álacre e sedento,
de focinho pontiagudo,
que fossa através de tudo
num perpétuo movimento.

Eles não sabem que o sonho
é tela, é cor, é pincel,
base, fuste, capitel,
arco em ogiva, vitral,
pináculo de catedral,
contraponto, sinfonia,
máscara grega, magia,
que é retorta de alquimista,
mapa do mundo distante,
rosa-dos-ventos, Infante,
caravela quinhentista,
que é cabo da Boa Esperança,
ouro, canela, marfim,
florete de espadachim,
bastidor, passo de dança,
Colombina e Arlequim,
passarola voadora,
pára-raios, locomotiva,
barco de proa festiva,
alto-forno, geradora,
cisão do átomo, radar,
ultra-som, televisão,
desembarque em foguetão
na superfície lunar.

Eles não sabem, nem sonham,
que o sonho comanda a vida,
que sempre que um homem sonha
o mundo pula e avança
como bola colorida
entre as mãos de uma criança.


António Gedeão - Pedra Filosofal


Imagem - À procura da Terra do Nunca, filme realizado por Marc Forster em 2004

sexta-feira, 20 de junho de 2008

C. C. Baxter(Jack Lemmon) e Fran Kubelik (Shirley MacLaine) - O Apartamento, realizado por Billy Wilder em 1960


"Temos de sonhar para conseguirmos levantar-nos de manhã"

Billy Wilder



terça-feira, 10 de junho de 2008

A vida é...

"A vida é uma oportunidade, aproveite-a...
A vida é beleza, admire-a...
A vida é felicidade, deguste-a...
A vida é um sonho, torne-o realidade...
A vida é um desafio, enfrente-o...
A vida é um dever, cumpra-o...
A vida é um jogo, jogue-o...
A vida é preciosa, cuide dela...
A vida é uma riqueza, conserve-a...
A vida é amor, goze-o...
A vida é um mistério, descubra-o...
A vida é promessa, cumpra-a...
A vida é tristeza, supere-a...
A vida é um hino, cante-o...
A vida é uma luta, aceite-a...
A vida é aventura, arrisque-a...
A vida é alegria, mereça-a...
A vida é vida, defenda-a..."

Madre Teresa de Calcutá

segunda-feira, 26 de maio de 2008

Diamantes


“-Escreveu-me?
- Sempre que pude. Se nunca as recebeu passo a resumir: Rezo para que esteja bem. Rezo para que me tenha no pensamento. Você é tudo o que me impediu de cair para um sítio escuro.
-Como consegui impedi-lo? Mal nos conhecemos. Foram apenas uns momentos.
- Um milhão de momentos. São como um saco cheio de diamantes. Não importa se são reais ou coisas que inventei. A forma do seu pescoço. Isso é real. A forma como a senti nas mãos quando a puxei para mim. Aquele beijo…que beijei todos os dias da minha caminhada.
-Todos os dias estive à espera. Ansiando ver a sua cara.”

Diálogo entre Inman(Jude Law) e Ada( Nicole Kidman) - Cold Mountain

Cold Mountain retrata a história de um soldado da guerra civil americana que em nome do amor deserta atravessando um país devastado, violento e desolador. As recordações dos momentos que teve com a sua amada são verdadeiras porções de força e incentivo que o permite aguentar e sobreviver aos horrores da guerra.
Este filme fez-me pensar precisamente nos pequenos momentos mágicos que temos ao longo da vida. Existem momentos assim. Poderá ser duas mãos que se entrelaçam pela primeira vez, os primeiros passos de um filho, um postal inesperado recebido de um amigo distante, uma música tocada num concerto em perfeita sintonia com as nossas emoções, um abraço que une dois corações que se juntam e que batem em conjunto, uma história contada debaixo de um céu de estrelas, um beijo que acende a vida, um mergulho num oceano cristalino, a descoberta de uma nova amizade… Momentos por vezes de apenas alguns segundos mas que ficam de tal forma gravados no nosso coração que os revisitamos toda a vida fazendo surgir sorrisos nos nossos lábios sempre que isso acontece.
Cada pessoa guardará no cofre do seu coração estes pequenos diamantes. Diamantes que por serem diamantes, durarão para sempre.

domingo, 25 de maio de 2008

Crescer

Por vezes pensamos conhecer bem o nosso universo interior, julgamos saber quais são os seus limites e fronteiras, controlamos as estrelas dos nossos sentimentos assim como as órbitas dos planetas das emoções. Por momentos quase que podemos assegurar ter algumas certezas inabaláveis.
Eis que, de forma inesperada, o universo dá uma cambalhota travessa e, ficando de pernas no ar, baralha todos os seus elementos. De um dia para o outro ficamos com as mãos cheias de estrelas, nebulosas, planetas, luas, cometas e meteoros. Olhamos para o céu vazio e queremos recordar onde estava cada um destes corpos celestes, queremos lembrar como brilhava aquela estrela antes ou em que sentido rodava determinado planeta mas por estranho que pareça não conseguimos…
Então, pouco a pouco, criamos uma nova ordem. Peça a peça vamos construindo um novo universo. Observamos que conseguimos colocar alguns elementos no lugar onde estavam anteriormente mas que existem outros que colocamos agora em posições completamente diferentes.
Reparamos então que as estrelas brilham agora com belas cores nunca antes vistas e começamos a amar o novo universo.
Reparamos que o universo é maior do que pensávamos, que o universo cresceu, que nós crescemos…

quinta-feira, 1 de maio de 2008

Eros e Psique

Nightmare before Christmas (1993) - Henry Selick/Tim Burton


Conta a lenda que dormia
Uma Princesa encantada
A quem só despertaria
Um Infante, que viria
De além do muro da estrada.

Ele tinha que, tentado,
Vencer o mal e o bem,
Antes que, já libertado,
Deixasse o caminho errado
Por o que à Princesa vem.

A Princesa Adormecida,
Se espera, dormindo espera,
Sonha em morte a sua vida,
E orna-lhe a fronte esquecida,
Verde, uma grinalda de hera.

Longe o Infante, esforçado,
Sem saber que intuito tem,
Rompe o caminho fadado,
Ele dela é ignorado,
Ela para ele é ninguém.

Mas cada um cumpre o Destino
Ela dormindo encantada,
Ele buscando-a sem tino
Pelo processo divino
Que faz existir a estrada.

E, se bem que seja obscuro
Tudo pela estrada fora,
E falso, ele vem seguro,
E vencendo estrada e muro,
Chega onde em sono ela mora,

E, inda tonto do que houvera,
À cabeça, em maresia,
Ergue a mão, e encontra hera,
E vê que ele mesmo era
A Princesa que dormia.

Fernando Pessoa - Eros e Psique

terça-feira, 29 de abril de 2008

Beja - Abril 2008

"Ai eu já pensei,
Mandar pintar o céu em tons de azul,
Pra ser original
Só depois notei,
Que azul já ele é houve alguém,
Que teve ideia igual..."
O Anzol - Rádio Macau

quinta-feira, 17 de abril de 2008

Saramago brevemente nas salas de cinema

Se podes olhar, vê. Se podes ver, repara.
Livro dos Conselhos
(citação presente na primeira página do livro Ensaio sobre a Cegueira)

Fernando Meirelles (realizador de filmes como o Fiel Jardineiro e Cidade de Deus), adaptou para cinema a obra de José Saramago vencedora de um Nobel (Ensaio Sobre a Cegueira). Blindness é o título do filme que promete tornar-se num dos melhores do ano quer seja pela história, pelo realizador ou pelo elenco (Julianne Moore, Mark Ruffalo, Danny Glover, Sandra Oh e Gael García Bernal ). Ainda falta algum tempo até à estreia mas já há um trailer( http://www.youtube.com/watch?v=r9S2KwhKGO8) onde não deixa de ser uma honra poder ver algo como "Based on the novel by Nobel Prize Winner José Saramago"…

segunda-feira, 14 de abril de 2008

Estórias da Avó

Confesso que tinha dúvidas se o passar dos anos não teriam feito desaparecer um pouco estas estórias ou então que as personagens das telenovelas que a minha avó segue com grande assiduidade se tivessem infiltrado nestes contos e, de certa forma, os tivessem modificado. Lembrava-me de algumas frases, de personagens, mas precisava de ouvir de novo as estórias para poder perceber as peças que me faltavam para ligar cada fragmento solto. Reparei então que a essência de cada estória continua lá. As frases e as personagens podem-se ter alterado um pouco mas o entusiasmo com que ela é contada mantêm-se.
“Como é que é aquela estória da mão?” - Esta é a "palavra passe" para a minha avó começar a desenrolar o novelo das estórias. Aqui fica esta versão baseada num desses contos, o conto das mãos.
Era uma vez uma família muito pobre. Esta família era tão pobre que mal conseguia ter dinheiro para comprar as suas refeições diárias. Alimentam-se quase sempre de sopas e podem pensar: "Então a sopa até é um prato com muita vitamina!". Pois é, mas esta sopa só tinha batata e cenoura, aliás, a sopa era sempre feita da mesma batata e da mesma cenoura durante todo o mês. Ou seja, quando chegava ao fim do mês as únicas vitaminas que comiam era a da ferrugem das colheres.
Certa noite a família encontrava-se reunida a jantar um carapau assado no forno. O pai fazia a divisão das doses: cabeça e barbatanas para o pai, lado direito para a filha, lado esquerdo para o filho, barriga e rabo do carapau para a mãe e espinhas para o gato.
- Comam devagar para não se engasgarem! – diz a mãe.
-Mastiga de boca fechada Carlos António! – ordenava o pai
Truz, truz. Batem à porta.
- Quem será marido? A uma hora destas…
- Não sei, espero que não venha para jantar…Deixa que o pai tira as espinhas, Micaela Carina, que estou já estou mesmo a ver que ficas com uma espinha entalada na goela.
Levanta-se a esposa e vai tentar ver quem é por entre os espacinhos das tábuas (material de que era feito aquela singela moradia). Não vê ninguém…
Truz, truz. Outra vez a porta.
- Marido, vai lá tu ver! Que eu não vejo ninguém!
Levanta-se o marido desta vez. Abre a porta. Encontra do outro lado um velho, de óculos escuros, anéis de ouro em todos os dedos, camisa havaiana, calções de Lycra, uma bengala e uma mochila em forma de urso às costas.
- Boa noite! Ouvi dizer que nesta casa têm-se andando com um certo vazio de estômago! Pois trago-lhe boas notícias para vos dar: expiraram-se os tempos de roer ossinhos, acabaram-se as bocas a salivar quando só os olhos comem os Cornetos que estão nos cartazes de gelados, trago aqui a solução para todos os seus problemas. Não , não é um Vaporetto Titano, é muito melhor que isso.
Despejou a mochila na mesa daquela família: várias caixas em madeira de diferentes tamanhos, um chupa-chupa, bolachas para diabéticos e um corta unhas. Guardou tudo de novo, menos as caixas.
- Ora aqui está! – anunciou o senhor dos anéis.
Com cuidado abriu cada uma das caixas. Enquanto a família olhava estupefacta e incrédula.
-Mas isso são….- balbuciou a mulher.
-Sim ! É mesmo isso que está a ver! Isto são mãos!!! - confirmou de novo o senhor das bijutarias.
E realmente para espanto de todos , aquilo eram mãos. Mãos de diversos tamanhos.
- Tudo o que têm de fazer é escolher uma das mãos, levá-la para o centro da mesa e dizer: Põem-te mesa! – ensinou o ancião.
- Paiiii!! Eu não quero comer mões!!! – avisou a pequena Micaela .
- Fica descansada minha filha que isto não é para comer!! E diz-se mãos e não mões…
- O teu pai tem razão, isto não é para comer, mas escolhe uma e faz como eu te disse e verás o que acontece .- disse o velho apontando para as mãos.
Então a menina, um pouco desconfiada, aproximou-se e escolheu a mão mais pequenina que ali havia. Levou-a para o centro da mesa e disse as palavras do velho:
- Põem-te mesa!!!
De repente aquela mão ganhava vida. E do nada, fazia aparecer deliciosos manjares, alimentos que os olhos , as bocas e os narizes daquela família nunca tinham experimentado nas suas vidas. Em poucos minutos aquela mesa vazia tinha-se enchido de carnes frias e quentes, achigãs, mousse de chocolate, pudins Boca Doce, gelatinas, cerejas, morangos, cabeças de porco, doce da avó, marmelada,…
Os olhos daquela família brilhavam e sem cerimónias sentaram-se à mesa e começaram a comer como se não houvesse amanhã. O velho sorria de satisfação pela alegria daquela família. Arrumou as suas coisas e saiu lentamente sem que ninguém desse pela sua saída. Ninguém notou também que a toda aquela cena assistia, espreitando por uma janela aberta, uma curiosa vizinha. Vizinha essa que se apressou a ir ao encontro do velho assim que ele saiu de casa:
- Senhooor!!! Espere lá que eu também quero uma mão dessas! Ahh!! Que coisa mais rica eu nunca vi uma coisa igual…Olhe mas eu quero ai a maior, que a minha filha vai casar agora no fim-de-semana, e assim já estava o copo de água encaminhado. Parecendo que não é uma ajudinha grande!!- disse a vizinha invejosa.
Não se contentando com a mão pequena levou então a mão maior...
Chegou o dia do casamento. Noivos, convidados, senhor prior, todos sentados à volta de uma mesa vazia.
- Mãezinhaaaa!! O que é isto? Onde está a comida???- disse a noiva, manifestando algum histerismo recalcado.
- Calma minha filha. Espera ai que já vais ver! – disse a mãe confiante.
Então disse as palavras mágicas. Fez-se um silêncio. A mão ganhou vida . De repente, em vez de fazer aparecer alimentos, a mão deu início à maior distribuição de que há história de sopapos, chapadas, galhetas, bofetadas, lambadas, estalos, estaladas, tapa-olhos, enxota-moscas e belinhas. Todos tiveram a mesma dose. D
izem que, ainda hoje o senhor prior não vai aos copos de água dos casamentos que faz, tal não foi o susto do pobre homem.
Olhando para a única comida que os seus olhos viam agora, os dois bifes do lombo que tinha nos olhos para reduzir as equimoses, arrependia-se agora a vizinha de não ter escolhido uma mão mais pequena e aprendia, de uma dura forma, que não se deve ter mais olhos que barriga.

quinta-feira, 3 de abril de 2008

Voar

Beja - Abril 2008

O céu é o lugar onde o ar é gelado
e onde respiras e vives,
onde desejas poder flutuar, sonhar,
correr e brincar todos os dias da tua vida.
O céu existe para todos,
mas só alguns ousam buscá-lo.

Richard Bach - Estranho à Terra

domingo, 9 de março de 2008

Era uma vez...

Numa noite em que o sono teimava em não aparecer surgiu, pé ante pé, a história da fada Amélia...


Era uma vez uma fada. A fada Amélia. Não era uma fada cheia de brilhantes, de vestido cor-de-rosa e com uma varinha luminosa. Não! Esta fada há anos que se vestia sempre da mesma forma: bata com chinelos no Verão e roupão com pantufas no Inverno. A sua varinha de luz mortiça estava gasta e aborrecida de realizar sempre os mesmos truques que consistiam essencialmente em fazer aparecer lasanhas, pizzas, ou qualquer banquete que servisse para saciar os apetites da já rechonchuda fada. Vivia numa casa situada bem no alto de um enorme pinheiro, era uma casinha pequena, tal como pequena era a fada, (de facto a fada não era maior que a chama de uma vela). Passava os dias sentada no seu sofá a beber coca colas, seven ups e sumóis (momento de publicidade), não precisava de se mexer para nada, tudo o que necessitava fazia aparecer com a sua varinha. Queria cortar as unhas, usava a varinha mágica. Queria mudar o canal de televisão, usava a varinha mágica. Queria um roupão novo ou umas pantufas do Noddy, usava a varinha mágica. Queria uma telenovela nova, usava a varinha mágica. Queria afugentar as moscas, usava a varinha mágica. Queria passar uma sopa, usava a varinha mágica (bem, nem sempre, às vezes usava o passe-vite). Assim era a vida desta pouco activa fada.

De facto ela até não era preguiçosa, mas há muito tempo que andava desmotivada, achava que já nada de novo lhe podia acontecer, conhecia todos os recantos do mundo, conhecia todas as emoções e desejos dos humanos e até dos animais. Mas não era isso a causa da sua desmotivação. O que a deixava frustrada, triste e a levava a empanturrar-se de bebidas gaseificadas com corantes e conservantes era o facto de já ninguém acreditar em fadas, já ninguém pedia às fadas para realizar um sonho ou concretizar um desejo (o mesmo se passava com os génios das lâmpadas mágicas, mas esses já andavam a falar com o sindicato). Só conhecia uma jovem que estava sempre a falar em fadas, a pedir coisas às fadas, a cantar às fadas, a falar com as árvores, a dizer que não tinha nada mas tinha tudo, que era rica em sonhos e pobre em ouro... Mas essa jovem foi só o passo que faltava para a fada começar a introduzir na sua dieta: os torresmos, a chanfana à moda das velhas fadas, o entrecosto frito, as sopas de toucinho…Só assim conseguia aliviar as “cargas de nervos” que apanhava com aquela irritante moça.

Mas a fada sabia que a sua própria existência, era uma prova que, algures no mundo deveria haver alguém que ainda acreditava verdadeiramente em fadas, que ainda haveria sonhos à espera de uma ajuda de fada para ser realizados. Sabia que, no dia em que as pessoas deixassem de acreditar, as fadas iriam desaparecer para sempre. E ela sabia que isso ainda não tinha acontecido, pois conhecia outras fadas, falava com elas ao telefone todos os dias, sabia que havia algumas fadas a trabalhar no aeroporto dos pirilampos usando o seu brilho para indicar o local de aterragem, ainda na semana passada tinha recebido uma reunião de fadas em sua casa para uma demonstração de tupperwares. Tinha de haver alguém que ainda acreditasse, simplesmente, ela estava cansada de procurar. Durante muitos anos procurou até que um dia desistiu tal como todas as suas amigas fadas mais cedo ou mais tarde tinham acabado por o fazer.

Certa noite a fada Amélia, sentia-se entediada, agastada, incomodada, chateada e enfadada. Na televisão estava a dar um episódio do CSI repetido pela milésima vez, noutro canal estava a dar O Toca a Ganhar e programas de televendas em todos os restantes canais. Olhou para a varinha mágica e viu que estava a ficar sem bateria, foi até à sala para a pôr a carregar e ao olhar pela janela teve uma ideia:

-Não é tarde nem é cedo é mesmo agora que eu vou sair um bocadinho. Parecendo que não já lá vão uns aninhos que não saio de casa, além disso exagerei no cozido de grão do jantar e um passeio vai ajudar à digestão.

Então a fada Amélia, foi buscar o brilhante vestido das asas, sacudiu-lhe o pó, vestiu e…hoo rasgou-se. Pois, era de esperar, não há vestido que resista a uma alimentação destas. Mas a fada estava determinada e resolvido o contratempo lá foi ela a voar bem alto (bem, não tão alto assim…e não vou dizer porquê, não é muito prudente falar do peso de um fada, principalmente se não quisermos ficar a coaxar).

Percorreu campos. Observou as estrelas e a companheira lua. Ao longe viu uma pequena vila. Decidiu aproximar-se. A vila dormia, não se via ninguém pela rua, dois gatos procuravam a ceia no lixo do único restaurante da vila e os grilos faziam a sua serenata. Uma luz vinda de uma janela despertou a atenção da fada. A curiosa da fada espreitou, não viu ninguém e entrou. Era um pequeno quarto, iluminado com uma luz suave, uma música de embalar tocava e num cantinho ela viu um berço. Aproximou-se devagarinho e… ficou maravilhada, lá dentro um bebé dormia profundamente. O bebé sonhava e, como todas as fadas, a Amélia conseguia ouvir os sonhos dos humanos. Ao ouvir os sonhos daquele bebé a fada sorriu e uma lágrima de alegria surgiu dos seus olhos. A fada percebeu que a certa altura num tempo distante as fadas tinham mostrado aos homens que eles eram capazes de realizar os seus próprios sonhos, que quando esses sonhos se realizam pelo esforço do próprio homem têm um sabor mais doce e que os homens não só não tinham esquecido as fadas como também tinham gravado nos seus corações a gratidão deste ensinamento recebido. Os sonhos e os desejos fariam sempre parte da natureza humana. A dormir, a criança sorriu e ao de leve a fada Amélia deu-lhe um beijinho luminoso.

Nas suas tertúlias de final de tarde para jogar poker, bisca dos nove e burro em pé as amigas da fada Amélia dizem que ela não parece a mesma:

- Agora alinha em todas as nossas excursões para ir às termas, a festas e piqueniques - constata a fada da Fruta.

-Aiiiii…! A moça está óptima! Está d-i-v-i-n-a-l!!! Olha! Vendeu a varinha mágica, empregou-se na Pirilampes Airlines, asseada, amiga de se arranjar ao espelho durante horas…Digo-te sinceramente, se não soubesse não a reconheceria – diz a fada Castelo Branco

-Pois foi, pois foi! Inscreveu-se na clínica Fadona e já perdeu dez quilos! Está uma autêntica modelo. Agora só come é tofu e beringelas recheadas com tomate. Diz que vai casar daqui a três meses com o grilo Altifalante… - finaliza a fada dos Molotofes.

segunda-feira, 3 de março de 2008

A família deliciosamente disfuncional do filme Uma Família à Beira de Um Ataque de Nervos


"O nosso lar é tudo o que conhecemos e amamos. Quando estamos juntos, estamos em casa. Um lar não é um sítio. Não creio que o conhecido e o amado tenham tecto, ou que estejam ligados por pregos, vigas e cimento. O nosso lar é uma determinada ordem que nos é querida, na qual não há perigo de sermos quem somos."

Richard Bach - Uma Aventura do Espírito

sábado, 1 de março de 2008

Quando as palavras são armas...

Nos meus cadernos de aluno
Na minha carteira, e nas árvores
Na areia e na neve
Escrevo o teu nome

Em todas as páginas lidas
Em todas as páginas brancas
Pedra, sangue, papel e cinza
Escrevo o teu nome

Sobre as imagens douradas
E nas armas dos guerreiros

Ou na coroa dos reis
Escrevo o teu nome

E pelo poder da palavra
Recomeço a minha vida
Nasci para te conhecer
Nasci para te chamar
Liberdade.

Paul Éluard - pequeno excerto do poema "Une Seule Pensée" (Um Único Pensamento). O poema foi distribuído como um panfleto, lançado por aviões aliados nos céus de uma Europa em guerra, quando a terrivél ameaça nazi tentava esmagar a liberdade, em 1943.
Imagem -O beijo da Time Square. O beijo de despedida da Guerra fotografado por Victor Jorgensen na Times Square em 14 de Agosto de 1945, no final da II guerra mundial. Um soldado da marinha norte-americana beija apaixonadamente uma enfermeira. Segundo se conta, eram perfeitos estranhos que haviam acabado de encontrar-se.

sábado, 23 de fevereiro de 2008

Beja- Fevereiro 2008

"Mais do que um país
Que a uma família ou geração
Mais do que a um passado
Que a uma história ou tradição
Tu pertences a ti
Não és de ninguém ...
Mais do que a um patrão
Que a uma rotina ou profissão
Mais do que a um partido
Que a uma equipa ou religião
Tu pertences a ti
Não és de ninguém ...
Vive selvagem
E para ti serás alguém
Nesta viagem ...
Quando alguém nasce, nasce selvagem
Não é de ninguém"
Delfins - Nasce selvagem
(M. Angelo / F. Cunha)

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

A Magia do Cinema

Histórias contadas através de imagens e sons, emoções despertadas por músicas e cores misturadas e projectadas numa tela viva, histórias reais, histórias imaginárias, retratos daquilo que somos, daquilo que podemos ser, viagens a destinos longínquos, ao passado, ao futuro, à mente, heróis que despertam heróis, sonhos por alguém sonhados que fazem nascer outros sonhos e outros contos.
A 28 de Dezembro de 1895 dois irmãos apresentavam no Grand Café do Boulevard des Capucines em Paris, perante uma plateia maravilhada, as primeiras imagens em movimento, de algo tão banal como a saída dos operários de uma fábrica. Assistia-se então ao nascimento do cinema.
Se o desejo imenso do ser humano em contar histórias fez nascer o cinema, então a paixão por as escutar, fê-lo crescer e evoluir até aos dias de hoje.
(Imagem -Toto (Salvatore Cascio) do filme Cinema Paraíso)

terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

Oscar 2008

Falta menos de uma semana para os Óscares. Aqui fica um belo vídeo que homenageia os nomeados deste ano.

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

Dois mestres do humor falam de amor...

"Eu tive sorte. Quando conheci a mulher dos meus sonhos, soube-o de imediato. Vi-a, e fiquei logo incapaz de falar. A minha garganta ficou bloqueada, o meu estômago dava nós, eu estava todo suado, pegajoso e enjoado. Tinha aprendido, anos antes, que sentires-te enjoado frequentemente significa que estás apaixonado. (Outras vezes, apenas significa que comeste amêijoas estragadas, e deves aprender a distinguir entre os dois.)
Mas eu sabia que era isso. E quanto mais tempo passávamos juntos, mais convencido eu ficava- nós encaixamos."
Paul Reiser - Criador, actor da série Mad About You(série que passava há uns anos nas noites da TVI sob o nome de Doido Por Ti) e autor do livro com o mesmo nome.

"O bonito na mulher que amamos, ao ponto de nos doer a barriga, não é o que todos vêem. É o facto de ela ter birra de sono, de sussurrar em eslovaco a letra daquela música americana, e cantar o refrão mais alto, de demorar 40 minutos todos os dias para se vestir e dizer "hoje nada me fica bem". Todos esses pequenos defeitos, só nós os conhecemos. Todos esses defeitos são, analisando a conta-gotas sentimentais, preciosas qualidades."
Bruno Nogueira - humorista, actor e apresentador de televisão

quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

Vida

Claire (Kirsten Dunst) e Drew (Orlando Bloom) - Elizabethtown

"Um dos lemas dos Serviços Especiais da Força Aérea é: "Aqueles que arriscam, vencem.". Um simples pé de videira consegue vingar através do cimento. O salmão do Pacífico luta ferozmente na sua tentativa de percorrer quilómetros rio acima contra a corrente, com um único objectivo, o de acasalar claro está, mas também...a VIDA"
Drew (Orlando Bloom)- Elizabethtown

domingo, 27 de janeiro de 2008

Ouro sobre azul

Moura, Outubro de 2007


"Sentir tudo de todas as
maneiras,
Ter todas as opiniões,
Ser sincero contradizendo-se a
cada minuto"

Álvaro de Campos- Passagem das Horas

quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

Esperança

Ouvi esta história há uns anos numa noite de contos realizada na biblioteca de Beja.Não recordo alguns pormenores mas era mais ou menos assim:
Um avô, olhando para as chamas de três velas, começou a contar uma história ao neto:

-Era uma vez três velas assim cintilantes como estas que estás a ver agora. Estas velas eram especiais pois cada uma delas tinha o seu nome: Fé, Amor e Esperança. Elas brilhavam noite e dia sem nunca esgotarem a sua luz. Uma luz que dava volta ao mundo e que tinha o poder de iluminar até o local mais profundo e escuro da terra. Um dia a chama da Fé apagou-se e o mundo ficou ligeiramente mais escuro, assim como ficou a sala agora, depois de eu apagar esta vela.
O menino escutava com toda a atenção.O avô continuou:

- Certa noite, uma brisa atrevida soprou mais forte, então a chama da vela chamada Amor não resistiu e apagou-se também. O mundo ficou um pouco sombrio. Era difícil de conseguir distinguir as cores e as formas, tudo parecia cinzento como naqueles filmes antigos que o avô gosta de ver. Inexplicavelmente até as músicas pareciam cinzentas.

O menino mostrava-se preocupado dirigindo o seu olhar para a vela que ainda restava acesa. Então o avô passou carinhosamente a mão pela cabeça da criança e disse:

-Não te preocupes! Porque enquanto restar a chama da Esperança podemos sempre acender a chama das outras duas velas. E assim as chamas da Fé, Amor e Esperança poderão continuar a iluminar os nossos corações.

E segurando na última vela ainda acesa, o avô reacendeu as outras duas, a sala iluminou-se de novo e os olhos do menino voltaram a brilhar com entusiasmo.

Ver


"O essencial é saber ver,
Saber ver sem estar a pensar,
Saber ver quando se vê."
Alberto Caeiro - O Guardador de Rebanhos