segunda-feira, 26 de maio de 2008

Diamantes


“-Escreveu-me?
- Sempre que pude. Se nunca as recebeu passo a resumir: Rezo para que esteja bem. Rezo para que me tenha no pensamento. Você é tudo o que me impediu de cair para um sítio escuro.
-Como consegui impedi-lo? Mal nos conhecemos. Foram apenas uns momentos.
- Um milhão de momentos. São como um saco cheio de diamantes. Não importa se são reais ou coisas que inventei. A forma do seu pescoço. Isso é real. A forma como a senti nas mãos quando a puxei para mim. Aquele beijo…que beijei todos os dias da minha caminhada.
-Todos os dias estive à espera. Ansiando ver a sua cara.”

Diálogo entre Inman(Jude Law) e Ada( Nicole Kidman) - Cold Mountain

Cold Mountain retrata a história de um soldado da guerra civil americana que em nome do amor deserta atravessando um país devastado, violento e desolador. As recordações dos momentos que teve com a sua amada são verdadeiras porções de força e incentivo que o permite aguentar e sobreviver aos horrores da guerra.
Este filme fez-me pensar precisamente nos pequenos momentos mágicos que temos ao longo da vida. Existem momentos assim. Poderá ser duas mãos que se entrelaçam pela primeira vez, os primeiros passos de um filho, um postal inesperado recebido de um amigo distante, uma música tocada num concerto em perfeita sintonia com as nossas emoções, um abraço que une dois corações que se juntam e que batem em conjunto, uma história contada debaixo de um céu de estrelas, um beijo que acende a vida, um mergulho num oceano cristalino, a descoberta de uma nova amizade… Momentos por vezes de apenas alguns segundos mas que ficam de tal forma gravados no nosso coração que os revisitamos toda a vida fazendo surgir sorrisos nos nossos lábios sempre que isso acontece.
Cada pessoa guardará no cofre do seu coração estes pequenos diamantes. Diamantes que por serem diamantes, durarão para sempre.

domingo, 25 de maio de 2008

Crescer

Por vezes pensamos conhecer bem o nosso universo interior, julgamos saber quais são os seus limites e fronteiras, controlamos as estrelas dos nossos sentimentos assim como as órbitas dos planetas das emoções. Por momentos quase que podemos assegurar ter algumas certezas inabaláveis.
Eis que, de forma inesperada, o universo dá uma cambalhota travessa e, ficando de pernas no ar, baralha todos os seus elementos. De um dia para o outro ficamos com as mãos cheias de estrelas, nebulosas, planetas, luas, cometas e meteoros. Olhamos para o céu vazio e queremos recordar onde estava cada um destes corpos celestes, queremos lembrar como brilhava aquela estrela antes ou em que sentido rodava determinado planeta mas por estranho que pareça não conseguimos…
Então, pouco a pouco, criamos uma nova ordem. Peça a peça vamos construindo um novo universo. Observamos que conseguimos colocar alguns elementos no lugar onde estavam anteriormente mas que existem outros que colocamos agora em posições completamente diferentes.
Reparamos então que as estrelas brilham agora com belas cores nunca antes vistas e começamos a amar o novo universo.
Reparamos que o universo é maior do que pensávamos, que o universo cresceu, que nós crescemos…

quinta-feira, 1 de maio de 2008

Eros e Psique

Nightmare before Christmas (1993) - Henry Selick/Tim Burton


Conta a lenda que dormia
Uma Princesa encantada
A quem só despertaria
Um Infante, que viria
De além do muro da estrada.

Ele tinha que, tentado,
Vencer o mal e o bem,
Antes que, já libertado,
Deixasse o caminho errado
Por o que à Princesa vem.

A Princesa Adormecida,
Se espera, dormindo espera,
Sonha em morte a sua vida,
E orna-lhe a fronte esquecida,
Verde, uma grinalda de hera.

Longe o Infante, esforçado,
Sem saber que intuito tem,
Rompe o caminho fadado,
Ele dela é ignorado,
Ela para ele é ninguém.

Mas cada um cumpre o Destino
Ela dormindo encantada,
Ele buscando-a sem tino
Pelo processo divino
Que faz existir a estrada.

E, se bem que seja obscuro
Tudo pela estrada fora,
E falso, ele vem seguro,
E vencendo estrada e muro,
Chega onde em sono ela mora,

E, inda tonto do que houvera,
À cabeça, em maresia,
Ergue a mão, e encontra hera,
E vê que ele mesmo era
A Princesa que dormia.

Fernando Pessoa - Eros e Psique